domingo, 1 de novembro de 2015

Tesouro

Tesouro

Dentro de mim fogo e água
O desejo que se apaga
Quietude que evapora
Galope medido à espora
O salto interrompido
Capoto em acrobacia
Mas sorrio, mas sorrio

Mas sou rio com pouca água,
Ou enchente que foge ao leito
Nunca água mansa e cálida
Sou vela que apagando
Chia como avantesma zombando
E taca fogo em cortina
Pra ver a paisagem se ardendo

Nem centímetro nem quilo
Não sou isso nem aquilo
Sou energia que, escassa
Ou que queima a resistência
Do oito ao oitenta não há nada entre
E me preparo para sair de um estado
Para o outro cruzando 
minhas cidades imaginárias
- infinitos mapas de risco torto.
Onde estará enterrado o meu tesouro?
Onde estará enterrado o meu tesouro?

domingo, 11 de outubro de 2015

Dhyani e Orixás

Dhyani e Orixás


Akshobhya e Yemanjá chamam o olhar
Para as águas, para o céu: azuis espelhos.
Toco a terra e vejo o sol a iluminar -
Queima a ira como incenso em seus conselhos.

Vairochana e Omolu, brilho do sol,
Fazem refletir o branco de minha mente.
Seus ensinamentos soam soberanos -
O silêncio me domina plenamente.

Amitabha e Ewá no pôr do sol,
Um amor vermelho se estendeu no céu.
Nuvens rasgam-se nos seus tons de rosicler -
Eu contemplo a mente como esse painel.

Amoghasiddhi e Oxossi, em verdes matas,
Se embrenhando com coragem, destemidos.
Sob o sol da meia noite, invisíveis –
Eu também exploro a mim, bem protegido.

Ratnasambhava e Oxalá, dadas as mãos,
Ciranda de abundância com todos os orixás.
Sob o sol do meio dia, joias de sabedoria –
Também danço e me oferto, imensa paz.



Marcelo Asth


sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Eu Sei

Eu Sei




Antes de achar Sua Morada,
Mendigo pelas ruas sem teto,
Arquiteto do Nada,
Com paredes me espremendo.
Incômodo de labirinto –
Tento, mas nunca Me sinto,
Só Estou ali a vagar no escuro.

Ao fechar dos olhos, piscar de pálpebras,
Clarão e estrondo: a mente apaga.
Acordo e recordo o acordo.
Sou Eu ali, candelabro aceso,
Ileso, surpreso e sem máculas,
Posto sobre a mesa do Divino,
Banquete, sublime fartura!

É um Casarão de mil cômodos!
Um Caleidoscópio em festa!
Sem mais dor do incômodo,
Sorrio só de pertencer...
A cada aposento, descubro-me lento,
Pleno, atento, alento, bento,
A ver pelos corredores quadros do que Eu já era.
Cada cômodo que abro é uma sala de espera.
Sua Luz me invade a Alma,
Sinto-me Dono também da Casa
E giro, giro, suspiro,
Meu fogo lambe as cortinas sobre os meus olhos!
Danço voando sobre as cinzas,
Meu coração alucina...
Suspendo-me e lá de cima,
Estupendo o Encontro Comigo Mesmo.
Vejo morto o meu passado
E só Me vejo agora em Ti.

Neste terreiro Sagrado,
Sou mais Um Coração Alado,
Fazendo espelhar o cosmos
Na gira-devir do derviche,
Gerando vastos universos
Que se unem ao que já existe.
Tudo é união, derrubaram-se as paredes!
Olho pro céu, vejo redes
De conexão com o Tudo!
Arquiteto o futuro
Ao saber em Mim a Verdade.
Tudo que há assim Me invade,
Nada em Mim é mais o Exílio.
Sou Dono das Estrelas,
Pois delas Sou Filho.
Escrevo Meus versos
Com a Luz do Seu brilho.

Sou Tu, Eu Sei, Eu Sou,

e só sigo o sossego desse Seu Amor.


Ar Khalil



sábado, 15 de agosto de 2015

Carinho


Abra-se a si e se abrace, sim.
Silencie, se enlace, ciencie a respeito do mundo.
A festa divina é alquímica que me queima
E transmuta, transmite a mutação dos movimentos incandescentes e subintes,
dos átomos, nesse átimo, nesse ótimo.
Abrir-se a lata com precisão do furo, sem ferir, dar luz ao escuro,
pegar sol no que é guardado a pó e silêncio.
Tirar o telhado do sótão pro vento visitar levando o tempo
e deixar de ser o só tão vazio e se visitar com alegria.
E se abraçar, se abrasar, sem se atrasar.
Estar apenas consigo, entregue e límpido ao carinho mais lindo.


Marcelo Asth

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Reforma

Reforma

Sento e medito.
Sinto e me edito.
Me digo não mendigo,
Sem ser pedinte, sem ser pedante.
Sem cercear meu ar,
ser mais horizonte.
Não me preparar, não me pré-parar:
Ir em frente, enfrentando a mente.
Vibrar intenso, menos tenso,
Menos denso, mais imenso,
Apontando o dedo na ponta do medo,
Fechando os medos e os dedos, palma a palma.
A quietude é questão de atitude e calma.
Não mascarar a cara e a alma,
Apenas Ser para crescer.
Fazer o afazer com prazer,
Agradar e Ser,
Agradecer, Ser, Ser!
Não pelo dever, mas por apenas Ser.

Sentar-me à mesa daquele que convida com vida.
Alegrar-me à mesa tendo ou não alguma comida.
Entender que a viagem é com ida, sem volta,
Embarcar na Estação da Luz sem revolta,
Estar são, firme, ciente da partida -
Que longo e sem tino é o destino -
Sentindo que a sina ensina,
Sabendo que a estrada é terna mente viva,
Trabalhando sem receio.
Pois a viagem não é comprada,
A missão está comprida
E ninguém veio à passeio.

Marcelo Asth

domingo, 24 de maio de 2015

Trismegisto

TRISMEGISTO



Tudo ele organiza,
ele nos convida a aprender.
O Homem de nada sabe
e tudo pode conhecer...
No bico da íbis,
o sol de Osíris
raiando em lótus do Nilo.
Mensageiro e escriba
Deus Toth do Egito,
do invisível escrito
Magia de Trismegisto.

Treme o gesto do teu símbolo,
tudo vibra e é fremente,
masculino e feminino,
tudo é duplo, o Todo é Mente.
Tudo o que está embaixo
vem de cima em reflexo
e ele escreve tudo em fluxo
num refluxo complexo -
tudo o que há dentro dele
é expansão do Universo.
Tudo está em correspondência
naquilo que é revelado.
Toda causa é consequência
daquilo que é semeado.

Há na semente o cosmos
e a terra há de senti-lo.
As aves espalham felizes
o segredo que brota tranquilo.
No bico da íbis,
o sol de Osíris
raiando em lótus do Nilo.
Mensageiro e escriba
Deus Toth do Egito
do invisível escrito,
Magia de Trismegisto.



Príncipe Orclã

quarta-feira, 22 de abril de 2015

PÓS

PÓS



Após banquetes imperiais,
em grandes salões com festanças,
em almoços semanais,
restaurantes sem balanças,
empregados, escravos ou serviçais,
depois do encher das panças;
sabão, água, bucha por trás
de toda gula de comilanças.

Tantas e tantas mulheres,
 no aniversário dos filhinhos,
lavam o chão e os talheres -
do tapete tiram os docinhos.
Louças, garfos e colheres
na esponja deslizam aos carinhos...

Depois das áreas de lazer
há sempre áreas de serviço,
sempre depois do prazer,
quem que manda e o submisso,
responsável do afazer,
em mansões ou no cortiço,
alguém que está pra fazer
o que o sempre está omisso.
Trabalhador do dever
ou escravo do compromisso.

Entra século, sai século,
entre anos, entre os panos
que se caem sobre os atos,
sempre há alguém nas cozinhas
com bicas e panos de pratos
a lidar com o pós das festas,
limpando os pós dos fatos.


Marcelo Asth

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Silêncio

Havia-me chegado o silêncio
Em carruagens de cavalos dóceis
- uma pausa no ruído do tempo.

Embora me fosse um alento,
Surdo era ao relinchar dos fósseis
Que há eras me sinalizavam
A brandura do aquietamento.

Passavam por minha porta galopes
revirando o pó da estrada...
Mas eram nuvens de barro o que eu via,
E nada mais via, mais nada, mais nada...

Cansado do dia após dia,
Rebelde animal selvagem,
Dispus certo a aquietar-me
Dentro de meu coração, estalagem.
Retirei todo o pó do ouvido
E me pus atento à passagem,
Certo de que algo do olvido
Viria trazer-me a mensagem.

Na hora exata, posto ao meu portão,
Os cavalos me passaram mudos,
Ao passo que compassava o coração 
Pulsante no trote dos cascos,
Ditando o ritmo, a luz, o cheiro,
E mais que tudo isso:
Vi a imagem de meu cocheiro.

Era Eu desse tílburi o guia,
Nas mãos, as rédeas envoltas
A controlar-me em alegria
Em livres risadas soltas.
Quando parada a carruagem,
Podendo ouvir-me tão pleno,
Recebi de mim o convite 
E ingressei com o peito ameno.

Havia-me o silêncio chegado 
Em carruagem de dóceis cavalos...
Um ruído na pausa do tempo,
Atento ao momento esperado.

Mesmo não claro o destino,
Para onde me sigo indo,
Apenas escuto meus trotes
Ecoando a canção do divino.



domingo, 1 de março de 2015

Grude

Não gruda no chiclete,
Vence a gravidade
E voa sobre,
Sobrevoa
Sobre tudo o que sobra.
Faz com a leveza, dança.
Retira os véus de mil sombras
Ao mesmo tempo em que pisa
Sem grudar.
Abre olhos, sem remelas -
Por que tê-las?
Sem remoer,
Olha as estrelas
E vai voando em direção -
Tendo em vista que
Tudo o que voa
Não passa do chão.

     

Montagem feita pelo amigo Bento!